quinta-feira, 11 de setembro de 2008

O Espelho Atormentado de Russell Edson

Já aqui tinha falado de um livro de que gostei bastante – O Túnel, de Russell Edson, publicado pela Assírio & Alvim, com tradução de José Alberto Oliveira. Gostei tanto que, algum tempo depois, fui presenteada com O Espelho Atormentado, lançado entretanto pela OVNI, numa edição bilingue e com a tradução a cargo de Guilherme Mendonça. Tal como acontecera com O Túnel, fiquei deslumbrada com a escrita de Edson. O original, The Tormented Mirror, foi publicado em 2000 e reúne uma série de poemas que haviam sido publicados em diversas revistas.
Uma vez mais deparamo-nos com uma obra de difícil catalogação em termos formais: são poemas, são fábulas, são pequenas histórias? Ao que parece , trata-se de poemas em prosa, o que, diga-se de passagem, muito tem contribuído para a marginalização desta obra por parte dos académicos americanos (ai, os cânones, os cânones…). No entanto, e com toda a justiça, não é este preconceito académico que impede Russell Edson de ser reconhecido como um dos mais importantes autores de poesia em prosa norte-americanos.
Mas a originalidade não se limita ao plano formal; em termos de conteúdo, vamo-nos apercebendo que tudo é possível. Uma vez mais, deparamo-nos com histórias bizarras, repletas de humor e nonsense, umas com finais absurdos outras com finais absurdamente lógicos, numa osmose perfeita entre realidade e sonho e surrealidade.
O livro lê-se de uma acentada e se é certo que na maior parte das vezes os textos nos remetem para realidades efabuladas e inesperadas, outras há em que nos fazem reflectir sobre a absurda e óbvia simplicidade do que nos é dado a ler, como este excerto do poema "A Casa Assombrada":

“A morte chegou trazendo consigo a vida. Foram amantes desde o início. Alimentaram-se uma à outra. A vida deu de comer à morte, mas a morte também alimentou a vida. Era um hábito, não podiam viver uma sem a outra.

Deus disse, haja vida, mas que a morte seja a sua guardiã…”

EDSON, Russell – O Espelho Atormentado. Entroncamento: OVNI, 2008. Pág. 15.

1 comentário:

Curufinwë disse...

É pena que o genial seja, quase imperativamente, marginal.