quinta-feira, 19 de junho de 2008

Futebol: Coesão ou Alienação? – Parte II

Quem for da mesma opinião que eu e considerar que o futebol é um factor de alienação da sociedade, encontrará facilmente acontecimentos que corroborem esta opinião. Ainda assim, decidi deixar aqui alguns exemplos recentes que me fazem ter cada vez mais certeza da minha opinião. Quero apenas deixar aqui um pequeno esclarecimento, para que não me acusem de miopia clubística - eu não sou adepta de nenhum clube. As poucas influências que tenho são estas: um pai e um irmão portistas (mas que nem sempre sabem quando são os jogos), um marido benfiquista (que não sabe quando começa ou termina o campeonato) e um avô sportinguista (que acha que nunca mais vai ver o Sporting ganhar um campeonato). Ou seja, estou rodeada de opiniões diferentes, mas de pessoas tão desligadas do futebol, que talvez nem sejam considerados adeptos por muitos.

Quanto aos exemplos que referi, são eles os que se seguem.

1.º Quando ocorreu aquele incidente com o seleccionador Scolari e o jogador Sérvio, em que o primeiro agrediu o segundo, tudo indicava que aquele seria exemplarmente punido. Compreensivelmente os patrocinadores da selecção colocaram em causa a continuidade do brasileiro enquanto seleccionador. Não é que o primeiro-ministro José Sócrates, segundo relatou a comunicação social, convenceu Gilberto Madaíl a não despedir Scolari? O que é que se pode dizer desta promiscuidade relacional? Parece que realmente é preciso oferecer pão e circo ao povo, para o manter domado... Isto para não falar da total ausência de valores que emana de tudo isto – enquanto professores são suspensos por fazerem piadas visando figuras públicas, usando a liberdade de expressão a que têm direito, seleccionadores que agridem em directo são defendidos por altos membros da Nação.

2.º O FCP foi condenado por 2 actos de tentativa de corrupção pela LPFP: enviou um comunicado à CMVM, afirmando aceitar a condenação e o pagamento da quantia estipulada. Ou seja, não recorreu da decisão, logo esta transita em julgado, o que é, obviamente, uma assunção de culpa. Agora que a UEFA, baseando-se nos mesmos factos, os considera culpados e os deixa de fora da Liga dos Campeões, "eh pá, espera aí, vamos recorrer da decisão, porque só agora é que nós lembramos que somos inocentes". Se recorrem da decisão da UEFA é porque se consideram inocentes. Mas se se consideram inocentes porque não recorreram da decisão da LPFP? Com os castigos impostos pela LPFP podia o clube bem, não era? Já o castigo imposto pela UEFA, foi um bocado mais difícil de engolir. Entretanto, o FCP recorreu efectivamente da decisão e ao que parece ficou o dito pelo não dito. Mas isto surpreende alguém?

Como disse, e contrariamente ao que possa parecer, não tenho nada contra o FCP, assim como não tenho nada a favor (nem contra o SLB, ou SCP ou qualquer outro clube). A minha irritação e indignação são contra os dirigentes do FCP (e não jogadores, obviamente) porque é deste clube que se trata. Há aqui uma questão de fundo – houve tentativa de corrupção e isso ficou provado. E tentar é tão mau como fazer. Se eu tentasse assaltar uma loja e fosse apanhada, isso faria de mim menos culpada? Não, porque só não concretizara porque fora apanhada. Caso contrário... Isto parece-me óbvio! Depois, a tentativa de desviar a atenção do que é importante, alegando que as escutas telefónicas não são válidas... Pois, mas existem! Isto faz-me lembrar aquelas situações que por vezes ocorrem na adolescência: a mãe entra no quarto e encontra droga, o adolescente rebela-se (invertendo a situação) e afirma que a mãe violou o seu direito à privacidade ao entrar no quarto. Mas a questão é que a droga estava lá...

E é realmente desviando a atenção do cerne da questão que se consegue visibilidade mediática e se consegue distorcer as coisas: foi a FPF que não defendeu o clube como devia, foi a UEFA que não soube avaliar o caso e foi dura na pena, foi o SLB e outros clubes que alertaram para o caso e tentaram ganhar com ele... E já não há pachorra para o chavão constantemente repetido de que outros estão a tentar ganhar na secretaria o que o FCP conquistou em campo. Mas ao tentar corromper árbitros, o FCP também não tentou ganhar na "secretaria"? Se realmente o SLB e outros clubes procederam a algum tipo de calúnia ou ofensa ao FCP, pois que sejam punidos. Acho bem! Mas a questão neste caso específico não é essa.

No entanto, é com armas de arremesso como esta que os dirigentes do FCP (e em especial o Sr. Pinto da Costa, que tem um estranho prazer em alimentar constantemente com as suas palavras, a imbecil e despropositada rivalidade entre Lisboa e Porto) lutam. Instigam sócios, adeptos e simpatizantes e sabem bem que o fazem e o quão perigoso isso é.

E que tipo de adeptos são estes? Os que são sócios dão o seu dinheiro ao clube, vêem o seu dirigente máximo ser condenado por crimes de corrupção, mas para eles todos têm culpa, menos o culpado efectivo. E daí a insultar magistrados, outros dirigentes e outros adeptos vai um passo! Eu assisto a conversas nos transportes públicos, onde pululam insultos a todos os que não são portistas, que fariam corar o Fernando Rocha.

É a isto que chamam coesão?

Mas enfim, é o futebol que temos, os dirigentes e os adeptos que temos. E ao que parece ainda não é desta que a culpa arranja marido. Cada vez mais percebo por que motivo não sou adepta ou sócia seja do que for. Os unanimismos desagradam-me. A leviandade com que se diz “nós” assusta-me e normalmente é perigosa. Não preciso de um “nós” que me diga o que pensar, preciso que me mostrem factos para “eu” o fazer. Nunca gostei de nada que me tolhesse as ideias. Não deixei que a religião e a política o fizessem e não deixarei, certamente, que seja o futebol a fazê-lo.

1 comentário:

Curufinwë disse...

Ia abster-me de comentar, mas não posso evitar: o Vale e Azevedo esteve preso (e muito bem, por sinal!) e ainda não terminou os seus "percalços" com a Justiça.